quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O mundo já acabou antes...

 Estávamos sentados no banco em frente a sua casa. Seus pais haviam viajado, o jardim cheio de camomilas e rosas tinha um cheiro bom essa hora da noite. Em alguns lugares era possível (ou pelo menos desejável) se perder. Eu apontei o cruzeiro do sul no céu e você riu, eu só conhecia aquela única constelação.
 Nossos pés descalços sentiam a grama. Tentávamos decifrar uma mensagem escrita no chão pelo tato. Meus braços se enlaçavam no seu vestido e por baixo dele em sua cintura fina. Pisávamos as flores tão bem cuidadas, profanando-as. Meu rosto conhecia o teu, mas os pensamentos eram sempre ocultos. Minhas mãos conheciam tuas costas da mesma forma que as tuas conheciam as minhas. As rosas caninas nos arranhavam, tentando nos repreender. Experimentamos mastigar algumas pétalas adocicadas.
 Caímos abraçados na grama e fomos afundando. O céu se tornava menos visível,  e a terra nos devorava faminta. Chegamos a total escuridão do mundo dos mortos. E todos os que se foram antes de nós conversavam conosco e nos contavam segredos. Nossos pés sujos de terra, na cabeça uma coroa de raízes secas. Rei e rainha do submundo. Nos serviram vinho num crânio, para celebrar nossa união. E nos beijamos milhas abaixo de nossa morada. Celebramos o amor como os mortos celebram a saudade. Não seriam a mesma coisa? Não é esse nosso futuro?
 Um suspiro conjunto de todas as coisas vivas nos levou de volta a superfície. E deitados entre as flores reparamos que as estrelas rodopiavam lentamente. Você se despediu e entrou em casa e eu fui embora com as mãos nos bolsos. Se nossos corações batem no mesmo ritmo, ainda estarão unidos quando pararem?

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